GUIA PRÁTICO SOBRE A NOVA LEI GERAL DO TRABALHO: PARTE I – NOVO PARADIGMA DE CONSTITUIÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Já é de domínio público que, no dia 27 de Dezembro de 2023, foi publicada, em Diário de República, a Lei n.º 12/23, que a aprova a Nova Lei Geral do Trabalho, adiante “NLGT”, que estabelece um novo quadro legal aplicável às relações laborais de carácter privado.
Com o presente Guia, pretendemos abordar, de forma prática, os principais aspectos que foram alterados pela NLGT. Nesta primeira parte, abordaremos o Novo Paradigma de Constituição do Contrato de Trabalho.
II. O NOVO PARADIGMA DE CONSTITUIÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
A NLGT estabelece o contrato por tempo indeterminado como regra (n.º 1 do art.º 14.º
[1]). Isso significa que o empregador apenas poderá contratar por tempo determinado dentro dos limites e nos casos em que a NLGT estabelecer, nos termos do art.º 15.º, nomeadamente:
a) Substituição de trabalhador temporariamente ausente | até 36 meses;
b) Acréscimo temporário ou excepcional da actividade normal da empresa resultante de acréscimo de tarefas, excesso de encomendas, razão de mercado ou razões sazonais | até 12 meses;
c) Realização de tarefas ocasionais e pontuais que não entram no quadro de actividade corrente da empresa | até 12 meses;
d) Trabalho sazonal | até 6 meses;
e) Quando a actividade a desenvolver, por ser temporariamente limitada, não aconselha o alargamento do quadro do pessoal permanente da empresa | até 12 meses;
f) Execução de trabalhos urgentes necessários ou para organizar medidas de salvaguarda das instalações ou dos equipamentos e outros bens da empresa de forma a impedir riscos para esta e para os seus trabalhadores | até 6 meses;
g) Lançamento de actividades novas de duração incerta, início de laboração reestruturação ou ampliação das actividades duma entidade empregadora ou centro de trabalho | até 60 meses;
h) Desempregado há mais de um ano ou elementos doutros grupos sociais abrangidos por medidas legais de inserção ou reinserção na vida activa | até 36 meses;
i) Execução de tarefas bem determinadas, periódicas na actividade da entidade empregadora, mas de carácter descontínuo
[2];
j) Execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil e obras públicas, montagem e reparações industriais e outros trabalhos de idêntica natureza e temporalidade | até 36 meses;
k) Aprendizagem e formação profissional prática | até 36 meses.
A Inspecção Geral do Trabalho poderá autorizar o prolongamento da duração do contrato para além de 36 meses, mediante requerimento fundamentado da entidade empregadora, até 30 dias antes do termo, acompanhado de declaração de concordância do trabalhador, nos seguintes casos e situações:
a) Substituição de trabalhador temporariamente ausente | Se o regresso do trabalhador temporariamente ausente não tiver lugar dentro daquele prazo;
h) Desempregado há mais de um ano ou elementos doutros grupos sociais abrangidos por medidas legais de inserção ou reinserção na vida activa | Se as medidas legais de política de emprego dos grupos sociais estiverem ainda em aplicação à data de termo dos 36 meses do contrato;
j) Execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil e obras públicas, montagem e reparações industriais e outros trabalhos de idêntica natureza e temporalidade | Se a duração dos trabalhos de construção civil e actividades equiparadas for ou se tornar superior a três anos;
Em todo o caso, o prolongamento da duração do contrato não pode ser autorizado por mais de 24 meses (n.ºs 2, 3 e 4 do art.º 16.º).
III. FORMA DO CONTRATO
Salvo nos casos em que a NLGT ou outro diploma determinar, o contrato de trabalho assumirá a forma que for estabelecida pelas partes (verbal ou escrita). Entretanto, em regra, o contrato de trabalho verbal será considerado por tempo indeterminado (n.ºs 1 e 4 do art.º 12.º). O contrato será tido também como celebrado por tempo indeterminado se não fizer menção de qualquer um dos elementos obrigatórios, contidos no n.º 1 do art.º 13.º, nomeadamente:
a) Identificação e residência habitual dos contratantes;
b) Classificação profissional e categoria ocupacional do trabalhador;
c) Local de trabalho;
d) Duração semanal do trabalho normal;
e) Montante, forma e período de pagamento do salário;
f) Menção das prestações acessórias ou complementares e das atribuídas em géneros, com indicação dos respectivos valores ou bases de cálculo;
g) Entrada em vigor e vigência do contrato;
h) Lugar e data da celebração do contrato;
i) Assinatura dos dois contratantes.
Além disso, para celebrar um contrato por tempo determinado, não bastará intitular o contrato como “CONTRATO DE TRABALHO POR TEMPO DETERMINADO”. O empregador deverá inserir no contrato, além da duração, as razões determinantes da contratação por tempo determinado. Se assim não ocorrer, o contrato será considerado por tempo indeterminado (n.º 2 do art.º 13.º).
Se, por exemplo, a empresa pretender contratar por tempo determinado um trabalhador em função do acréscimo temporário da actividade normal da empresa por ocasião do final do ano, poderá inserir na cláusula sobre a duração do contrato, o seguinte conteúdo: “O trabalhador é contratado por tempo determinado em função do acréscimo temporário da actividade da empresa, resultante do início da quadra festiva inerente ao final do ano”.
IV. REGIME DE RENOVAÇÃO DO CONTRATO
O contrato por tempo determinado poderá ser renovado sucessivamente pelas partes, dentro dos limites legais (art.º 17.º). Por exemplo, a NLGT dá a possibilidade de o empregador, nos casos de “trabalho sazonal”, contratar por tempo determinado até 6 meses. Assim, se o empregador contratar um trabalhador, nesta situação, por 2 meses, ele poderá renovar o contrato por mais 2 meses, sucessivamente, até ao limite de 6 meses, ou seja, primeiro, 2 meses, depois mais 2 meses e, por fim, mais 2 meses, completando assim os 6 meses.
A NLGT estabelece que a renovação do contrato por período diferente do inicial deve necessariamente ser reduzida a escrito (n.º 2 do art.º 17.º). Tendo em atenção o anterior exemplo, se o empregador contratar o trabalhador inicialmente para um período de 2 meses, e pretender renovar o contrato para um tempo diferente do inicial, eventualmente, para 1 mês ou para 3 meses, deverá ser feita uma renovação por escrito, através de uma adenda ao contrato, por exemplo. E se o empregador não reduzir a escrito a renovação por período diferente? Em princípio, vamos considerar o contrato como tendo sido renovado pelo mesmo período inicial. No caso do exemplo anterior, o contrato seria renovado por mais 2 meses. E se o empregador não pretender renovar o contrato? Neste caso, é obrigatório o aviso prévio de 30 dias[3]. A falta de cumprimento do aviso prévio constitui a entidade empregadora na obrigação de pagar ao trabalhador uma compensação correspondente ao período de 30 dias. Neste caso, é importante realçar que, ainda que o empregador falhe apenas 1 dia de aviso prévio, deverá pagar uma compensação correspondente a 30 dias (n.ºs 3 e 4 do art.º 17.º).
V. REGIME DE CONVERSÃO DO CONTRATO
O contrato de trabalho por tempo determinado será convertido em contrato de trabalho por tempo indeterminado, sempre que forem ultrapassados os períodos máximos estabelecidos pela NLGT (n.º 5 do art.º 17.º). Tendo novamente como exemplo a situação anterior, se depois dos 6 meses, o trabalhador continuar a exercer funções, o contrato será automaticamente convertido por tempo indeterminado.[4]
VI. COMO FICARÃO OS CONTRATOS CELEBRADOS ANTES DA NOVA LEI GERAL DO TRABALHO ENTRAR EM VIGOR?
Nos termos do art.º 319.º, sob epígrafe, “Aplicação da lei no tempo”, temos o seguinte regime:
1. Os contratos por Tempo Determinado celebrados à luz da Lei 7/15 de 15 de Junho, vigoram ao abrigo da respectiva Lei até à data prevista para a sua caducidade.
2. Se, à data da caducidade do contrato, as partes o pretenderem renovar, considera-se renovado nos termos da presente Lei.
3. A renovação feita nos termos do número anterior, não prejudica os direitos adquiridos do trabalhador.
Em termos simples, os contratos que forem celebrados antes da entrada em vigor da NLGT não serão considerados automaticamente como contratos por tempo indeterminado. Na verdade, o contrato conservará a data de duração inicial estabelecida pelas partes. Se, por exemplo, 3 meses antes de a NLGT entrar em vigor, a empresa A celebrar com o trabalhador B, um contrato por tempo determinado de 5 anos, a NLGT não vai alterar o prazo deste contrato que foi celebrado antes da sua entrada em vigor. Assim, o contrato vai ser considerado por tempo determinado até completar o tempo acordado pelas partes, no nosso caso, os 5 anos.
Mas pode ser que surja a seguinte pergunta: depois de terminar o período acordado pelas partes, o contrato será considerado como quê? Por tempo determinado ainda ou por tempo indeterminado?
A NLGT determina que a continuidade do contrato deve ser feita nos termos da NLGT. Assim, se o contrato estiver acima do limite máximo de contratação por tempo determinado, ele será convertido para contrato por tempo indeterminado.
VII. QUANDO A NLGT ENTRARÁ EM VIGOR?
Nos termos do art.º 322.º, a NLGT entrará em vigor 90 dias após a sua publicação. Assim, da contagem de 90 dias após a sua publicação (27 de Dezembro de 2023) temos como data de entrada em vigor o dia 26 de Março de 2024
VIII. CONCLUSÃO
Como já sabemos, a NLGT está recheada de inúmeras alterações, sendo que, uma das mais relevantes é a alteração do paradigma de constituição dos contratos de trabalho, estabelecendo como regime regra o contrato por tempo indeterminado. Assim, é importante que os profissionais que operam com o respectivo diploma, bem como as entidades a que ele se destina, estejam preparados e conheçam as novas regras de contratação e todos os novos regimes consagrados.Nas próximas partes do presente Guia Prático, abordaremos outr aspecto relevante da NLGT.
[1] Todos os artigos mencionados no presente Guia referem-se à NLGT, salvo indicação em contrário.
[2] Por lapso, o legislador não colocou a duração do contrato nesta situação, carecendo a Lei de uma rectificação.
[3] Sempre que a NLGT não mencionar dias úteis, devemos considerar dias de calendário ou corridos.
[4] Esta conversão não se aplica quando estiver em causa o contrato com um trabalhador reformado (n.º 6 do art.º 17.º).
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